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Editorial

Editorial Novembro 2011


Atração Fatal – Beijando Sapos Esperando Que Virem Príncipes!

Recentemente encontrei uma pessoa que conheci a onze anos, que sofria, na época, de Transtorno do Pânico. Era realmente triste ver como as crises a afetavam; mal saía de casa, sua vida profissional estava um desastre. Com tratamento ela foi melhorando e fiquei sem saber dela por bastante tempo.

Ao reencontrá-la fiquei surpresa com as mudanças: nada mais de pânico, sucesso na vida profissional, nunca a pessoa esteve tão bem e bonita. Por outro lado sua vida amorosa se tornou decadente, usava pessoas e sexo como se fossem brinquedos. Caridosa ontem, hoje não consegue dar um real para ajudar ninguém, pois está investindo em seus negócios e se focando em prosperidade. (Dito popular: a gente perde a saúde para ganhar dinheiro, depois perde o dinheiro tentando recuperar a saúde.)

Olhando para ela me lembrei do personagem de um livro que me impressionou muito: O Retrato de Dorian Gray, de autoria de um dos grandes escritores do século passado, Oscar Wilde. Dorian, além de lindíssimo, não envelhecia; uma tela pintada por alguém com poderes anormais é que sofria os efeitos do tempo e do envelhecimento. Dorian se tornou um predador de mulheres e homens, destruindo vidas de jovens, meninas, mulheres casadas e balzaquianas. Bem, você vai ter de ler o livro para saber o final, mas a estória nos leva a pensar que, às vezes, o sofrimento que a vida nos traz é nossa salvação de nossos desejos e ignorância.

Entendi finalmente uma estória que li há alguns anos no livro A Cabala da Inveja: alguém reclama para um rabino de um homem que era alcoólatra e vivia na vila. Perguntaram para o rabino por que ele não ajudava tal pessoa a parar de beber. Ao que o rabino respondeu: "Malac é pessoa bondosa e cumpridora de seus deveres, nunca machucou ninguém a não ser a si mesmo; existem razões para sua bebedeira, se ele parasse de beber talvez se tornasse um assassino".

Isto nos leva a pensar que talvez o pânico, – tão ruim quanto a bebedeira da Malac, era na verdade uma maneira de evitar que algo muito negativo na personalidade viesse a se manifestar nos dois casos: no conto judaico o viciado em algo poderia se tornar um assassino, no caso da pessoa que encontrei ela perdeu grandes valores que tinha em busca de sucesso. Conversando com uma pessoa do grupo, ela me contou sobre um péssimo relacionamento em que já está há alguns anos. Ela não consegue sair, é a tal da "atração fatal" (você se lembra do filme?). A coisa acontece assim: você encontra o belo e sente aquela atração irresistível por ele. É algo inconsciente: a maneira como ele te olha, o jeito de andar, o sorriso, talvez a voz. É uma reação física do nosso corpo e nosso cérebro, que seqüestra nossa sanidade.

Certa vez senti isto por um homem. Hoje somos amigos, mas minhas amigas me diziam que eu estava ficando doida. Lembro-me que ele veio para uma aula de meditação e quando saiu liguei para uma das amigas e disse: – Dei aula de meditação para um cara, durou uma hora... e estou apaixonada por ele... Eu me desequilibrei: uma parte minha me dizia que ele era o homem da minha vida, a outra parte – a que felizmente eu ouvi – me dizia que aquilo não tinha futuro e que a dor que estaria esperando por mim não ir ser nada engraçada.

No fundo do nosso ser, sabemos qual a voz que devemos ouvir. Se não a ouvimos é porque não queremos. Mas é igual a você estar caminhando em direção de num buraco: você sabe que vai cair, que vai machucar muito, que vai doer muito, que vai ser difícil sair, mas escolhe cair nele assim mesmo. Em longo prazo é burrice pura. Talvez todos que leiam este editorial se lembrem de alguém que lhes causou tal sentimento de insanidade, alguns conseguiram controlar, outros não. Essas paixões, como quase todas as paixões, são caminhos de sofrimento e decepções.

Conversando com uma conhecida, ela me contou que recentemente encontrou um cara que a fez sentir essa "atração fatal", e apesar disso ela percebeu que não gosta de estar com ele, não se sente confortável na presença dele, pois ele tem o hábito de diminuir os outros, conta vantagem o tempo todo, é mesquinho e não se envolve em nenhuma atividade humanitária, o que para ela é importante. A tal atração existe, ela pensa muito nele, mas quando estão juntos é desagradável quase o tempo todo, mas ela não consegue terminar o relacionamento.

Nosso corpo foi desenhado geneticamente para escolher um bom parceiro para procriarmos, para perpetuarmos a espécie, então nossa atração primária é pelo parceiro que nos dará uma prole saudável geneticamente. Mas essa atração hoje não é mais necessária e temos de ter controle sobre ela. E é claro que hoje em dia as mulheres estão muito mais conscientes de suas escolhas.

Mas é o que chamamos de beijar o sapo esperando que vire príncipe; se insistir corre o risco de se tornar uma sapinha. Melody Beattie, autora do livro Beyond Codependence, fala em um tipo ideal de pessoa. Dentro de nossas ilusões podemos descartar alguém por causa das roupas que ele usa, ou porque usa barba.... mas enfim é muito mais fácil conseguir que ele compre roupas mais bonitas ou que faça a barba, do que conseguir que aquele cara que exerce atração fatal sobre nós, e bebe ou é viciado em jogo, pare de beber ou jogar ou outros vícios piores. Então precisamos rever nosso conceito do parceiro ideal ou do nosso homem (ou mulher) ideal, ou esta pessoa na verdade seria nossa droga ideal: nós gostamos da reação química causada em nós.

Se voltarmos a falar no sapo, nos perguntamos: afinal, quem é o homem-sapo? Ele é alguém com quem não se pode ter um relacionamento satisfatório. Alguns sapos são melhores do que outros, mas um sapo é um sapo. Nós talvez sintamos uma energia correndo pelo nosso corpo quando vemos um, mas não precisamos pular no lago para ficar com ele. "Essas atrações fatais não são amor, não são vontade de Deus. Portanto, vamos parar de culpar Deus por essas atrações, que também não fazem parte do nosso destino", diz Melody.

A conclusão é que não temos de nos perder por amor ou por paixão. Na verdade, estabelecer limites para o que se quer ou não num relacionamento é muito saudável. Precisamos perder o medo da solidão, abrir mão da ilusão de um parceiro que preencha a descrição que idealizamos ao ler um livro de conto de fadas e construir um relacionamento baseado na vivência diária onde carinho, respeito e amizade estão envolvidos.

Para os Dorians Grays da vida, homens ou mulheres que estão no mercado destruindo corações e vidas, é bom lembrar que nossa construção de hoje será nosso abrigo amanhã e que todo ser humano é valioso e traz em si a semente divina, não devendo nunca ser menosprezado ou usado, pois a lição dos grandes mestres é sempre a seguinte: o que fazemos ao outro fazemos a nós mesmos!

Paz!

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